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Quando me descobri negra...

  • Paula Eduarda Soares da Silva
  • 7 de mai. de 2016
  • 3 min de leitura

Olá meus amores,

Hoje irei contar para vocês um pouco da minha história, focando no “período” em que descobri que era negra, muitas pessoas dão risada quando falo “Oi, meu nome é Paula Eduarda, tenho 17 anos e tenho consciência que sou negra a “X” anos.”

Por incrível que pareça, eu me considero negra a 1 ano 8 meses, eu fui criada pela minha vó e cresci acreditando que era branca, pois dentro de casa negrx era a pior ofensa a ser usada contra alguém, minha vó sempre dizia “Você não é negra, é queimadinha do sol”, alias até hoje ela odeia que eu fique no sol, acha que eu vou virar negra, na verdade eu nasci negra, mas ela não consegue admitir isso, lá no fundo eu sei que ela sabe, mas infelizmente ela é aquele tipo de pessoa que absorveu todo o discurso do opressor, acredita fielmente que os negros são inferiores: intelectualmente, na estética, na cultura, enfim, em todas as áreas.

E eu realmente acreditava nisso (séria cômico, se não fosse trágico), mas em agosto/2014 meu professor de sociologia do IFSP – Salto Leonardo Borges da Cruz me deu a oportunidade de fazer Iniciação Cientifica em relações étnico-raciais nas escolas municipais daqui da cidade, baseado na lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.

A partir dai minha vida mudou, ele me tirou de uma “bolha” onde tudo era perfeito e levou direto para a realidade desse mundo caótico, falou sobre racismo (eu não acreditava que isso existia), falou da naturalização do racismo, das diferenças sociais, do genocídio do jovem negro, da hipersexualização da mulher negra, a qual é preterida por homens negros e brancos.

Cada conversa, cada informação recebida era um tapa na cara, um choque de realidade, tinha dias que eu chegava da escola, deitava na minha cama e chorava por tudo que eu havia aprendido, a primeira vez que vi a palestra do André Santos Luigi formado em história na USP, que se chama “Racismo que “bicho” é esse?” foi horrível aquele turbilhão de informações, com imagens e vídeos, doeu tanto, vocês nem imaginam...

Mas o que doeu mais foi saber que tudo aquilo era verdade e ia muito mais além, bastava tirar a trava que estava no meu olho e ver o que estava ao meu redor, porque o racismo não acontece apenas em um lugar acontece em todos, basta parar de ignorar esse fato social.

Ai alguém vai dizer: “O seu discurso é acadêmico, você não tem vivência.” E eu lhe respondo alisar o cabelo pra se moldar ao padrão de beleza e se sentir bela - Não é vivencia? Ser abordada por seguranças no shopping sem nenhuma suspeita - Não é vivencia? Saber que não posso ir a uma entrevista de emprego com o meu Black - Não é vivência? Ouvir em uma cantada “Eu sempre quis saber como é sair/ficar/transar com uma negra.” - Não é vivência? Ser chamada de cabelo ruim, bombril ou duro, desde a infância - Não é vivência? Não ter brinquedos e desenhos negrxs durante a infância - Não é vivência? Não encontrar maquiagem no tom da minha pele - Não é vivência? Ouvir “Até que você é bonita/inteligente para uma negra.” - Não é vivencia? Deixa eu te contar uma coisa, eu passo por situações onde a discriminação racial é protagonista todos os dias, vamos a mais exemplos, quando aquela pessoa segura a bolsa com medo que eu roube, quando as pessoas duvidam que eu estudava no instituto federal e vou para uma universidade federal, afinal tem gente que acredita que nós negrxs não temos inteligência para isso, não é mesmo?

Uma coisa que aprendi é que não devemos acreditar em tudo que a grande mídia nos diz, eu sempre vi em novelas e jornais o homem negro como bandido e a mulher negra submissa aos cargos de limpeza e hipersexualizada descobri que a mídia NÃO REPRESENTA meu povo negro.

Fui apresentada a escritores, professores, músicos, atletas, jornalistas, guerreirxs, engenheiros, médicos, profissionais da área de humanas, exatas e biológicas, todxs negrxs.

A primeira coisa que fiz ao saber que a luta do movimento negro me pertencia, foi parar de usar químicas que modificam a textura do meu cabelo, para conhecer minha textura natural e parar de fugir de quem eu era, deixei a menina insegura em uma página lá atrás da minha história e me tornei a pessoa que nunca imaginei, que AFROnta o mundo e luta por tudo aquilo que acha certo. A cada dia o meu orgulho de ser negra só cresce, ver a luta do meu povo, conhecer a cultura e a história me fascina. Eu amo o meu cabelo crespo, minha pele preta, meus defeitos, estou transbordando amor próprio. E vou continuar R-existindo.


 
 
 

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